Embrapa Semiárido
Sistemas de Produção, 1 – 2a. edição
ISSN 1807-0027 Versão Eletrônica
Agosto/2010
Cultivo da Videira
Pedro Carlos Gama da Silva
Rebert Correia Coelho

Sumário

Apresentação
Caracterização social e econômica da cultura da videira
Aspectos agrometeorológicos da cultura da videira
Manejo e conservação do solo
Mecanização
Nutrição, calagem e adubação
Cultivares
Produção de mudas de videira
Implantação do vinhedo
Irrigação e fertirrigação
Manejo da parte aérea
Manejo de cachos e reguladores de crescimento
Doenças

Pragas
Normas gerais sobre o uso de agrotóxicos
Colheita e pós-colheita
Comercialização, custos e rentabilidade Referências
Glossário
Expediente

Caracterização social e econômica da cultura da videira


A viticultura no Submédio do Vale São Francisco
Importância econômica e social da videira

 

A viticultura na região semiárida, em particular no Submédio do Vale do São Francisco, destaca-se no cenário nacional, não apenas pela expansão da área cultivada e do volume de produção, mas principalmente pelos altos rendimentos alcançados e na qualidade da uva produzida. Seguindo as tendências de consumo do mercado mundial de suprimento de frutas frescas, esta região inclina-se, atualmente, para produção de uvas sem sementes, assim como para a adoção de normas de controle de segurança alimentar, em conformidade com os sistemas definidos pelas legislações nacional e internacional.

A cultura da videira reveste-se de especial importância econômica e social no Submédio do Vale do São Francisco, na medida em que envolve um grande volume anual de negócios voltados para os mercados interno e externo, e se destaca entre as culturas irrigadas da região, como a que apresenta o maior coeficiente de geração de empregos diretos e indiretos.

A viticultura no Submédio do Vale São Francisco

A produção brasileira de uva em 2008 foi da ordem de 1,42 milhões de t, destacando-se a região Sul como a maior produtora, participando com 936,7 mil t (66,0%) da produção brasileira de uva, enquanto a participação da região Nordeste foi de 18,8% (267,1 mil t), seguida da região Sudeste com 207,2 mil t ou 14,6% (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística-IBGE, 2009). Muito embora a região Sul apresente-se como a maior produtora de uva do País, vale ressaltar que a uva produzida nessa região destina-se, principalmente, à produção de vinho, enquanto nas regiões Nordeste e Sudeste predominam a produção de uvas de mesa. Em 2008, a produção brasileira de uva destinada ao consumo in natura representou 691,2 mil t, correspondendo a 49,4% da produção nacional, tendo a região Nordeste contribuindo com 37,7%.

A área colhida de uva no Brasil, em 2008, segundo os dados do IBGE (2009), foi da ordem 81.286 ha, dos quais 11.552 ha estavam localizados na região Nordeste, que correspondeu a 14,2% da área total cultivada com videira no País. Nesse mesmo ano, enquanto as produtividades médias nas regiões Sul e Sudeste oscilavam em 16 t.ha-1.ano-1 e 18 t.ha-1.ano-1, respectivamente, na região Nordeste, a produtividade média alcançou 23,1 t.ha-1.ano-1.

A produção de uva no Nordeste do Brasil concentra-se principalmente na região do Submédio do Vale do São Francisco, localizada nos sertões pernambucano e baiano. Favorecida pela potencialidade dos recursos naturais e pelos investimentos públicos e privados nos projetos de irrigação, esta cultura vem apresentando uma grande expansão ano após ano.

Dentre as culturas irrigadas exploradas no Submédio do Vale do São Francisco, a uva aparece como a segunda mais importante, em termos de área cultivada. No ano de 2007, a área plantada com videira, nos municípios pernambucanos e baianos, foi de 9.769 ha superada apenas pela cultura da manga (22.327 ha), representando, portanto, 97,9% de toda a área cultivada com uva no Nordeste (IBGE, 2009).

De acordo com os dados do IBGE (2009), em 2007, esta região já respondia por mais de 39,3% da produção de uva para o consumo in natura do País. Entretanto, quando se considera a produção de uvas finas para mesa com e sem sementes (‘Itália’, ‘Benitaka’, ‘Red Globe’, ‘Sugraone’, ‘Thompson Seedless’ e ‘Crimson Seedless’), ou seja, uvas da espécie europeia Vitis vinifera L., estima-se que a participação desta região pode chegar a 90% da produção nacional.

Convém ressaltar a especificidade da viticultura no Submédio do Vale do São Francisco, cujo cultivo é realizado em regime de irrigação. Em virtude da adaptação e do comportamento fisiológico diferenciado das diversas cultivares às condições edafo-climáticas deste ambiente, os processos fisiológicos das plantas são acelerados, vez que, em cerca de um ano após o plantio pode-se colher a primeira safra. Considerando-se que o ciclo produtivo da videira pode oscilar de 90 a 130 dias, dependendo da cultivar, pode-se obter até duas safras e meia por ano, mediante a adequação das técnicas de produção.

Isto possibilita a produção de uvas durante todo o ano, bem como a obtenção de produtividades maiores que 30 t.ha-1.ano-1, superando as obtidas nas demais regiões produtoras brasileiras.

Por outro lado, a readequação das técnicas de produção, também, permite que a colheita de uvas, com e sem sementes, para o consumo in natura, seja realizada nos períodos de entressafra do mercado internacional, quando os preços apresentam-se mais elevados. São estas peculiaridades que tornam a viticultura uma atividade com menor grau de incerteza e de elevada rentabilidade econômica para os viticultores do Submédio do Vale do São Francisco.

Importância econômica e social da videira

A uva e a manga constituem as principais frutas da pauta de exportação do polo Petrolina-Juazeiro. O volume das exportações proporcionado pela cultura da uva no ano de 2008, foi da ordem de 81.595 t envolvendo cerca de 170,4 milhões de dólares, que correspondeu a 99% do volume e do valor das exportações brasileira de uva (Tabela 1). Entretanto, é necessário ressaltar a importância que o mercado interno desempenha na dinâmica da viticultura deste polo, vez que, além da função complementar ao mercado externo, inclusive, determinando a economia de escala que a atividade exportadora exige, estima-se que o mercado interno absorveu cerca de 183,8 mil t de uva, o que corresponde a 69,2% da produção regional, no ano de 2008.

Este segmento do agronegócio da uva envolve um conjunto heterogêneo de agentes da cadeia produtiva com diferentes objetivos e estratégias de inserção no mercado, que procura responder à evolução da sofisticação de consumo com produtos condizentes com as qualidades exigidas pelos diversos mercados. Trata-se de uma atividade que envolve um número significativo de pequenos empreendimentos, seja pela participação de um grande contingente de pequenos produtores, seja pelo expressivo número de ocupações geradas na dinâmica de serviços em torno de inúmeras atividades desenvolvidas ao longo da cadeia de produção de uva desta região.

Em torno do mercado interno se insere a grande maioria dos pequenos produtores, que representam cerca de 75% dos viticultores e que detêm mais de 20% da área cultivada com videira. As diferentes estratégias adotadas por esses agentes dão origem às mais diversas formas de estruturas organizacionais e arranjos institucionais. Tabela 1. Exportação de Uva do Vale do Submédio São Francisco e do Brasil (1997-2008)

Tabela 1. Exportação de Uva do Vale do Submédio São Francisco e do Brasil (1997-2008)

ANO

VOLUME (t)

VALOR (US$1.000,00)

VALE


BRASIL

PARTICIP

VALE

BRASIL

PARTICIP

1997

3.700

3.705

100%

4.700

4.780

98%

1998

4.300

4.405

98%

5.550

5.823

95%

1999

10.250

11.083

92%

7.910

8.614

92%

2000

13.300

14.000

95%

10.264

10.800

95%

2001

19.627

20.660

95%

20.485

21.563

95%

2002

25.087

26.357

95%

32.460

33.789

96%

2003

36.848

37.600

98%

58.740

59.939

98%

2004

25.927

26.456

96%

48.559

49.550

98%

2005

48.652

51.213

95%

101.912

107.276

95%

2006

59.138

62.251

95%

112.510

118.432

95%

2007

78.404

79.081

99%

168.243

169.696

99%

2008

81.595

82.242

99%

170.400

171.456

99%

Fonte: Secex/Datafruta-IBRAF,citado por Valexport (2009).

Cabe ressaltar que na produção de frutas, cada vez mais, está sendo levado em consideração os novos requerimentos dos mercados. Estes requerimentos impõem um novo padrão de qualidade dos alimentos, incorporando as preocupações dos consumidores com a segurança alimentar e as exigências para certificação do produto, levando em consideração o local de produção e os aspectos ambientais e sociais. Nesse sentido, há uma tendência para o crescimento da produção de uva certificada, pela adoção da Produção Integrada de Frutas (PIF) ou da produção orgânica.

A produção voltada para um mercado de uvas de qualidade passa a exigir, cada vez mais, a utilização de novas tecnologias, mão-de-obra qualificada e serviços especializados, tanto no processo produtivo, quanto nas atividades pós-colheita. As exigências atuais das cadeias de abastecimento de uvas finas de mesa, baseadas em novas convenções de mercado constituem uma ameaça aos sistemas produtivos convencionais praticados pela maioria dos produtores desta região. Entretanto, a sua capacidade para adotar as novas normas e convenções relativas à qualidade converte-se numa ferramenta fundamental para alcançar um lugar privilegiado nos mercados, pois prevalecerão como fatores diferenciais na concorrência, o controle e a certificação dos processos produtivos. São estas exigências que passarão a arbitrar a inclusão ou exclusão dos produtores de uvas finas de mesa desta região. Nesse contexto, também emerge um contingente de pequenos e médios viticultores profissionalizados que, além de cumprirem uma função social importante, passaram a cumprir um papel no abastecimento do mercado doméstico e a buscar um espaço no mercado externo.

Entre as estratégias comerciais para o atendimento às novas exigências de mercado e agregação de valor ao produto, um procedimento importante é a consolidação das marcas nos mercados externo e interno. Nesse contexto, a aprovação do pedido de Indicação de Procedência (IP) Vale do Submédio São Francisco para empresas e agricultores filiados à União das Associações e Cooperativas dos Produtores de Uvas Finas de Mesa, pelo Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI), representou uma importante conquista para os produtores do polo Petrolina/Juazeiro. A IP, além de valorizar o vínculo da qualidade das frutas com o cultivo nas condições ambientais do Submédio do Vale do São Francisco, apresenta-se como um instrumento comercial importante para competir nos mercados do Brasil e do exterior.

A cultura da videira irrigada apresenta-se como a atividade agrícola que proporciona a maior geração de empregos no polo Petrolina,PE/Juazeiro,BA, chegando a gerar até cinco empregos por hectare/ano. Essa relação tem sido reduzida por um conjunto de inovações introduzido na base técnica de produção e na organização do trabalho no processo produtivo da uva. Mesmo assim, considerando-se a média de dois empregos diretos gerados por hectare no campo e quatro empregos indiretos decorrentes da dinâmica dos serviços dessa atividade, estima-se que a vitivinicultura nessa região gera mais de 72 mil ocupações diretas ou indiretas por ano.

 
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